Entre a Cor e a Dor: livro denuncia violência obstétrica enfrentada por mulheres negras no Brasil
Dissertação de mestrado de egressa da Unit se transforma em livro e revela como a interseccionalidade expõe mulheres negras a violações durante a gestação e o parto

A violência obstétrica atinge milhares de mulheres no Brasil todos os anos, mas os números se tornam ainda mais preocupantes quando analisados pela cor da pele. Pesquisas da Fundação Oswaldo Cruz (Fiocruz) indicam que mulheres negras têm o dobro de chances de sofrer agressões durante o parto em comparação com mulheres brancas. Entre os relatos, destacam-se procedimentos feitos sem consentimento, xingamentos, negligência e até a recusa de anestesia. Esse quadro, pautado por desigualdades estruturais, evidencia como o racismo está presente nos momentos mais sensíveis da vida: a gravidez e o nascimento de um filho.
Foi nesse cenário que Juliana Azevedo, mestra em Direitos Humanos pela Universidade Tiradentes (Unit), transformou sua pesquisa em livro. Inicialmente intitulada “Racismo obstétrico: análise da interseccionalidade e a violação de direitos humanos das mulheres brasileiras entre 2020 e 2023”, a dissertação defendida em dezembro de 2024 originou a obra Entre a Cor e a Dor: Racismo obstétrico e interseccionalidade no Brasil, publicada em julho deste ano. O livro conta com prefácio da professora Grasielle Borges, coordenadora do PPGD-Unit e orientadora da autora, e posfácio de Fernanda Mattos, atualmente doutoranda no mesmo programa.
Juliana explica que a decisão de publicar foi incentivada pela orientadora, que reconheceu o potencial da pesquisa para alcançar novos públicos. “Desde jovem, sonhava em ser autora publicada, escrever algo que contribuísse para a humanidade e para as relações sociais, especialmente em relação aos conflitos enfrentados pelas mulheres. O momento decisivo veio quando minha orientadora, professora Grasielle Borges, sugeriu a publicação do livro pouco antes da qualificação. Esse incentivo foi essencial, pois representou reconhecimento da relevância da pesquisa e da minha capacidade como cientista jurídica”, afirma.
Linguagem acessível e impacto social
Um dos diferenciais da obra é a linguagem utilizada. Juliana comenta que planejou desde o início um texto que pudesse dialogar não só com a academia, mas também com profissionais da saúde, operadores do Direito e o público em geral. “Queria que qualquer pessoa entendesse o que é o racismo obstétrico e como ele se manifesta. Usei termos técnicos, mas sempre explicados de forma clara e prática”, destaca.
A alteração do título, segundo a autora, também foi estratégica para aumentar a visibilidade e o impacto da obra. “Refleti bastante até chegar em Entre a Cor e a Dor. Era importante que fosse uma expressão forte, capaz de despertar a curiosidade do leitor e refletir a realidade dolorosa vivida por tantas mulheres negras no Brasil”, explica Juliana.
No livro, a autora aprofunda a análise sobre como o racismo estrutural, herdado da cultura colonial, influencia práticas de violência no parto. “O racismo obstétrico ainda é um conceito pouco difundido, mas ele existe e precisa ser nomeado. Só assim podemos enfrentá-lo. Minha pesquisa evidencia como as raízes históricas do racismo no Brasil estão diretamente ligadas às experiências dolorosas de mulheres negras em hospitais e maternidades”, ressalta.
A obra também propõe caminhos para enfrentar esse tipo de racismo, oferecendo uma base científica para discussões acadêmicas e para o desenvolvimento de políticas públicas que assegurem maior proteção às gestantes negras. O estudo exigiu um olhar aprofundado sobre a situação atual da violência obstétrica no país, detalhando suas manifestações e as conexões com a cultura colonial que se consolidou no Brasil.
Um livro para mulheres negras e para a sociedade
A expectativa da autora é que a obra alcance principalmente mulheres negras que desconhecem esse tipo de racismo, além de profissionais que podem atuar de forma preventiva. “Quero que meu livro seja uma ferramenta de informação e conscientização. Que desperte indignação diante do problema, mas também incentive soluções, pesquisas e políticas públicas em defesa dos direitos humanos e da maternidade negra”, afirma Juliana.
Atualmente, a mestra organiza o lançamento oficial do livro, previsto para outubro, e atua como professora convidada da pós-graduação em Direito Penal e Processual Penal da Unit. “Publicar Entre a Cor e a Dor é a realização de um sonho, mas também o começo de novos projetos. Quero continuar como autora jurídica e professora, sempre em diálogo com os Direitos Humanos e a transformação social”, conclui.
Por: Laís Marques
Fonte: Asscom Unit
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