É possível um retorno à escola que respeite os direitos fundamentais de crianças, famílias e educadores?

Publiciado em 14/08/2020 as 22:02

O Brasil enfrenta há alguns meses os efeitos devastadores de uma pandemia, a qual vem afetando não somente os indivíduos, mas também diversos setores da sociedade, dentre eles as instituições de ensino. Neste contexto, as escolas como organizações constituídas por sujeitos, um grupo diverso de pessoas que são diretamente impactados pela COVID-19, estudantes, professores, gestores, demais funcionários e famílias que precisam de atenção quando o assunto é um retorno às aulas presenciais.

 

Segundo a psicóloga Milena Aragão, Mestre e Doutora em Educação, membro do GT de Psicologia Escolar, do Conselho Regional de Psicologia de Sergipe- CRP19, as diretrizes para a abertura das escolas devem ser objeto de ampla discussão, caminhando na direção de um planejamento compartilhado, consciente e baseado nos direitos humanos de todas as pessoas envolvidas nesse processo.

 

“No que concerne direitos da comunidade estudantil, é importante respondermos as seguintes questões: como será garantido o direito aos cuidados para a preservação da saúde e proteção contra a infecção pelo Coronavírus? Como será realizado o período de acolhimento e adaptação, de modo que permita a expressão de sentimentos e suas reações a experiência frente a uma nova rotina? Como respeitar o direito a um ambiente educativo que lhe permita explorar, participar, brincar, expressar, conviver e conhecer-se em segurança? Como garantir o direito a frequentar a escola sem discriminação no caso da própria criança ou algum membro da família ter sido vítima da Covid-19?”, analisa.

 

A psicóloga ressalta que em se tratando das famílias, “como oportunizar o direito dos pais ou responsáveis a se sentirem seguros quanto aos cuidados com a saúde da criança? Como garantir o direito a estar presente no período de adaptação do aluno ao retorno às aulas, uma vez que crianças da educação infantil podem apresentar regressão em seus comportamentos e necessitarem de uma atenção especial? Como tranquilizar as famílias sobre possíveis problemas de adaptação da criança devido ao período de afastamento da escola? Como será realizado o processo de esclarecimentos e partilha de decisões sobre os cuidados para prevenção de infecção adotadas pela escola? Quais serão os canais de comunicação utilizados pela escola no que concerne as informações sobre mudanças em seu funcionamento que afetem a criança?”.

 

No âmbito dos profissionais da educação, a Dra. Milena Aragão levanta questões sobre como a escola assegurará os direitos dos professores de terem a saúde protegida, incluindo a saúde mental? Como será o protocolo escolar no sentido de oferecer orientação segura e atualizada a respeito das medidas necessárias de cuidados com a saúde de todos que frequentam o espaço educacional, bem como para a disponibilização de Equipamentos de Proteção Individual (EPIs)? Como garantir a proteção dos docentes e auxiliares que lidam com bebês e crianças muito pequenas, no que tange a troca de fraldas, banho e outros cuidados que demandam contatos corporais? Como assegurar o direito dos professores de participar da organização escolar em relação aos horários de funcionamento, usos dos espaços coletivos e critérios de agrupamento das crianças e jovens?  Como a escola oportunizará a formação continuada, de modo a proporcionar momentos de escuta de sentimentos e de troca de experiências nesse novo contexto? Como apoiá-los de forma a se sentirem confortáveis e seguros no ambiente de trabalho?

 

“Falar em volta as aulas é transitar por um solo desafiador. Não basta apenas uma adequação física para que as atividades presenciais retornem, é necessário cuidar de aspectos importantes referentes aos diversos grupos sociais que frequentam a escola. O Brasil é um país diverso, com realidades muito diferentes umas das outras.  Como pensar essa volta – com segurança – em cenários que apresentam dificuldades estruturais desde longa data? Como pensar em um retorno quando docentes e estudantes utilizam o transporte público para acesso as instituições de ensino? Tal indagação coloca-nos frente a dimensão inter-relacional, isto é, a escola não é uma ilha. Para que haja segurança intramuros, é importante observar o que ocorre no cotidiano”, elabora.

 

Para Milena Aragão, o retorno às atividades presenciais precisa ser visto sob múltiplos prismas, levando sempre em consideração a segurança de toda a comunidade escolar. “Há muitas dúvidas, porém uma certeza: não será possível retomar as atividades seguindo a mesma organização adotada antes da pandemia, tantos nos aspectos estruturais, quando nos psicopedagógicos. Será que estamos frente a uma oportunidade de repensar a escola, na sua forma e conteúdo? Será que estamos realmente preparados para um retorno?”, argumenta.

 

Assessoria de Comunicação CRP19