Lula é o único líder de uma grande democracia a apoiar Putin no desfile do Dia da Vitória

O presidente brasileiro se reunirá com seu homólogo e, após comemorar os 80 anos do fim da Segunda Guerra Mundial, embarcará para a China.

Publiciado em 14/05/2025 as 10:56

A Rússia celebra o 80º aniversário da vitória sobre o nazismo na Segunda Guerra Mundial nesta sexta-feira com um desfile solene na Praça Vermelha de Moscou. Ao lado do convidado mais ilustre, o chinês Xi Jinping, estará o brasileiro Luiz Inácio Lula da Silva, único líder de uma grande democracia que aceitou acompanhar Vladimir Putin em um evento que, além de celebrar o aniversário, visa projetar a imagem de que ele não está isolado após a invasão da Ucrânia em 2022. Lula vem a Moscou, apesar das críticas que a visita está gerando no Brasil, para apoiar um parceiro cofundador dos BRICS e um aliado na defesa do multilateralismo. De Moscou, Lula viaja para Pequim .

O presidente brasileiro tem encontro marcado com Putin e participará de um jantar no Kremlin nesta quinta-feira. "Minha visita à Rússia reafirma nosso compromisso com o multilateralismo. Assinaremos acordos de cooperação em ciência e tecnologia e buscaremos ampliar nossas alianças comerciais", declarou o presidente Lula na quarta-feira, ao chegar à capital russa. Mas os efeitos da guerra na Ucrânia na visita são evidentes. Moscou começou a semana com um ataque de drone ucraniano que forçou o fechamento de aeroportos.

A esposa de Lula, Janja da Silva, que viajou para a Rússia na semana passada, teve que mudar sua rota depois que a Letônia e a Estônia, ambas membros da UE e da OTAN, se recusaram a permitir que ela sobrevoasse seu território, revelou O Globo . E entre os convidados do desfile do Dia da Vitória, Lula será o único representante de uma potência democrática ocidental entre cerca de trinta convidados. Apenas um país da UE, a Eslováquia, um dos mais próximos da Rússia, está presente, juntamente com uma ampla gama de líderes de regimes autoritários, como os da Bielorrússia, Cuba, Mianmar, Venezuela, Egito e outros.

Putin e Lula não se encontram pessoalmente há anos porque o mandado de prisão do Tribunal de Justiça Criminal por crimes de guerra na Ucrânia impediu o russo de viajar ao Rio no ano passado para participar do G-20 , já que o Brasil pertence ao tribunal e, portanto, teria que prendê-lo caso ele pisasse em seu território; Ele também não deve comparecer à cúpula do BRICS que a cidade brasileira sediará em julho.

Também em 2024, Lula teve que cancelar uma viagem à Rússia na última hora devido a um acidente doméstico. O presidente brasileiro está estreitando laços com seus principais aliados orientais, enquanto o presidente americano Donald Trump o ignora. O que nestes tempos de beligerância americana é quase melhor. O Brasil foi um dos países menos afetados pela guerra tarifária. Mas, quase quatro meses após o retorno de Trump à Casa Branca, os líderes dos dois países mais populosos das Américas ainda não tiveram uma conversa, nem mesmo por telefone.

A presença de Lula ao lado de Putin significará "um desgaste para seus aliados tradicionais no Ocidente", alertou o diplomata Paulo Roberto de Almedia em declaração à CNN Brasil. Esses aliados já estavam decepcionados em 2022, quando Lula culpou o agressor e a vítima, Rússia e Ucrânia, respectivamente, pela guerra. Desde então, as relações entre Kyiv e Brasília ficaram tensas.

A diplomacia brasileira lembra nestes dias que condenou a invasão russa à Ucrânia na ONU e que, junto com a China, patrocinou uma iniciativa para uma solução negociada para a guerra. Isso nunca ganhou força real e foi completamente ofuscado pelas negociações que Trump impôs ao presidente ucraniano Volodymyr Zelensky.

Nesse contexto, e apesar de Lula estar cercado por uma maioria de autocratas nas arquibancadas, o governo brasileiro considera lógico apoiar um país aliado, como a Rússia, em um marco como a vitória de 1945 sobre Hitler.

O Brasil tem uma política externa bem estabelecida, aberta ao diálogo (e ao comércio) com todos os países e, em geral, permanece à margem do isolamento diplomático e das sanções de seus aliados ocidentais. Em meio a uma guerra tarifária, Lula insiste que não pretende escolher entre os EUA e a China e que quer manter boas relações com as duas superpotências.

Uma ideia que ele enfatizou em entrevista à revista The New Yorker : "Não aceitamos a ideia de uma segunda Guerra Fria. Aceitamos a ideia de que quanto mais semelhantes os países forem — tecnológica e militarmente avançados — mais eles devem se comunicar entre si, porque não tenho certeza se o planeta conseguirá suportar uma Terceira Guerra Mundial."

Além da geopolítica e da diplomacia, o Brasil está interessado em equilibrar sua relação comercial com a Rússia. De lá, importa principalmente fertilizantes — cruciais para o setor agrícola, que até a guerra eram comprados principalmente da Ucrânia — e diesel. Brasília quer aumentar suas exportações para a Rússia.

Enquanto a Rússia está acompanhada pelos Ministros de Minas e Ciência, a delegação na China é muito maior. Lá, Lula participará, junto com seus colegas Gabriel Boric (Chile) e Gustavo Petro (Colômbia), de uma reunião da CELAC. O brasileiro quer que os chineses diversifiquem suas importações e investimentos no Brasil. Com essa dupla viagem, o Brasil quer também ressaltar que sua política externa é independente, independente dos grandes blocos.

 

 

Fonte: El País