Ação policial contra referendo deixa quase 40 feridos na Catalunha

Publiciado em 01/10/2017 as 11:14


A Polícia espanhola recorreu à força neste domingo (1º), na Catalunha, para impedir a realização do referendo sobre a independência, deixando dezenas de feridos.

Os serviços de emergência da Catalunha anunciaram ter atendido, até o momento, 38 pessoas feridas em intervenções policiais para impedir a realização do referendo de autodeterminação.

Em um tuíte, as equipes de saúde relataram que "atenderam a 38 pessoas pelos disparos dos corpos policiais espanhóis".

"Do total, 35 foram levemente feridos, e três, mais gravemente. Nove deles tiveram de ser transportados para um centro médico. Trata-se, basicamente, de contusões, desmaios, ataques de pânico", acrescentaram no Twitter.

De acordo com várias testemunhas, a Polícia usou balas de borracha.

Jon Marauri, originário do País Basco, mostrou uma dessas balas à AFP, recolhidas após uma ofensiva policial contra centenas de manifestantes. Cercados pelos ativistas após apreenderam urnas em uma seção eleitoral, os agentes reagiram atirando. David Pujol, de 37 anos, mostrou o ferimento na perna, causado por uma dessas balas.

Diante da força policial, o presidente catalão, o separatista Carles Puigdemont, denunciou "o uso injustificado, irracional e irresponsável da violência por parte do Estado espanhol".

Segundo ele, a imagem externa do Estado "continua piorando e chegou hoje a níveis de vergonha que vão acompanhá-lo para sempre".

"Será o Estado espanhol que deverá explicar ao mundo o que fez hoje na Catalunha", afirmou a presidente do Parlamento catalão, Carme Forcadell, depois de votar.

O representante do governo espanhol de Mariano Rajoy pediu "solenemente" ao Executivo catalão que ponha fim à "farsa" do referendo.

"O presidente regional da Catalunha, Carles Puigdemont, e sua equipe são os únicos responsáveis por tudo que aconteceu ontem e por tudo que poderá acontecer, se não puserem fim a essa farsa", declarou o representante para a Catalunha, Enric Millo, em entrevista coletiva.

Reforço
Desde o início da manhã, a Polícia Nacional e a Guarda Civil - duas corporações que enviaram um reforço de mais de dez mil homens para a Catalunha - invadiram vários centros de votação em toda região para apreender urnas e cédulas, na tentativa de impedir a consulta proibida pela Justiça espanhola. Em vários lugares, as portas foram abertas a golpes.

Ainda assim, imensas filas se estendiam em vários postos. O porta-voz do governo regional catalão, Jordi Turull, disse que 73% das seções eleitorais "estão funcionando".

"Meu voto e a satisfação de ter votado ninguém pode tirar de mim, aconteça o que acontecer. Até chorei, porque há anos que lutamos por isso e vi, diante de mim, uma senhora de 90 anos na cadeira de rodas votando", contou à AFP a eleitora Pilar López, uma funcionária administrativa de 54 anos, na pequena cidade de Lladó.

O próprio Puigdemont não conseguiu votar no ginásio onde estava previsto inicialmente, na localidade de Sant Julià de Ramis, já que a Guarda Civil entrou à força e assumiu o controle.

Lá, a Guarda Civil montou um cordão de isolamento para impedir o acesso a dezenas de pessoas, constatou a AFP.

Os agentes forçaram a porta e invadiram o lugar para retirar o material de votação, diante de um grupo de pessoas que, com os punhos ao alto, cantava "Els Segadors", o hino catalão.

Puigdemont seguiu para uma seção eleitoral próxima para depositar sua cédula. A alteração foi possível, porque, no último minuto, o governo catalão instaurou um cadastro único de eleitores. Com isso, os 5,3 milhões de catalães convocados às urnas poderão votar em qualquer um dos 2.135 postos anunciados.

A prefeita de Barcelona, a esquerdista Ada Colau, também criticou o presidente do governo espanhol, Mariano Rajoy. Este ainda não se pronunciou.

"Um presidente de governo covarde inundou nossa cidade de policiais. Barcelona, cidade de paz, não tem medo", tuitou Ada.

'Levaram as urnas à força'
Nos postos que conseguiram abrir, o processo de votação se via seriamente dificultado por problemas de informática. Pela manhã, a Guarda Civil indicou que havia desativado o cadastro universal de eleitores.

No colégio Ramón Llull de Barcelona, a Polícia Nacional primeiro forçou o portão e, depois, a porta de vidro do prédio, em meio a dezenas de pessoas que tentaram barrar sua entrada.

Finalmente, os agentes levaram as urnas, enquanto a multidão gritava "Votaremos!" e "As ruas serão para sempre nossas!", observou um jornalista da AFP no local.

"Levaram as urnas à força, porque os presidentes das mesas agarravam as urnas com as duas mãos. Eles as arrancavam das mãos, literalmente, enquanto nós continuávamos cantando 'Els Segadors' e gritando 'Viva a democracia'", relatou o responsável por essa seção, Marc Carrasco.

Quatro horas antes do início da votação, milhares de cidadãos em Gerona, Barcelona, Lérida, ou Tarragona, haviam-se reunido pacificamente na frente dos centros de votação, para tentar protegê-los do fechamento e do desalojamento ordenado por uma juíza.

"Na Catalunha, estamos no ponto em que acreditamos que é essencial decidir se continuamos com o Estado espanhol", disse à AFP Pau Valls, um estudante universitário de 18 anos que acampou durante a noite no colégio Jaume Balmes, no centro de Barcelona