Há muito mais significado naquela nota do que um simplório, "nós erramos!". Contexto que precisa ser amplamente entendido, com a profundidade que uma mudança cultural causa!
Desde 2010, defendemos, internamente, que se avizinhava uma mudança radical nas condutas de quem tem relação com o Poder Publico; isso nos ajudou a agilizar a implementação de uma política interna de "compliance" em nossa firma Gilberto Vieira Advocacia! Foi um movimento complexo e difícil! Muitos de nossos clientes e colegas não entenderam o nosso endurecimento ético-jurídico! Era um discurso meio chato, tipo aquele sonhador que defende solitário uma tese no meio de pessoas comuns que lhes torcem o nariz! Mas, tínhamos certeza, o mundo não tinha mais cantos, não tinha mais esconderijos, tudo estava às claras, instrumentos de fiscalização cada dia mais eficazes, o MP independente demais e a ausência de precedentes que colocassem balizas entre crimes x erros administrativos x desvios éticos. O caldeirão começava a fever, todos poderiam ser depenados! O ditado precisava mudar: "a mulher de Cesar além de ser honesta, parecer honesta, precisa rezar para todos acreditarem que é honesta!"
Anos de reflexão me levaram questionar a delação; "reportante" era o antigo dedo duro! Desde ver uma de minhas filhas "fuxicar" do primo, e por essa delação receber a reprimenda de que não podia ser caguete, até a bronca que tomei de outro pedestre, em Mainhem, na Alemanha, ao atravessar uma rua deserta fora da faixa! Era uma questão cultural! Quem anda certo quer paridade, mas abaixo do Equador, é diferente, ninguém gosta de "ver ou comentar" os desvios dos outros! A confusão estava instalada na minha cabeça! Não adianta se afastar dos possíveis porcos, pois o brasileiro, culturalmente, quer um lugar para comer o farelo!
A prisão do Príncipe dos Empreiteiros fez com que, nas rodas de cerveja, eu não fosse mais visto como um enjoado! Não havia, a partir daquele momento, qualquer caminho para Odebecht que não a delação, a mudança de práticas empresariais e a postura visceral de combate à corrupção! O endividamento monstruoso da Gigante de Obras Públicas, a torna altamente dependente de boas práticas anti-corrupção sob pena de ver a Banca fugir de suas salas! O gestor do fundo de investimento das professoras aposentadas da Australia, liga para o gerente de um grande banco e diz: "se você tiver dinheiro em companhias corruptas vou tirar meus fundos dai"! Bingo, a Odebecht quebra fácil, fácil!
Para uma companhia mudar suas práticas é relativamente fácil, mas para se manter em um ambiente de oportunidades iguais, tem que acabar com o farelo! O príncipe entendeu, literalmente entre quatro paredes, que estava nu, não tinha como esconder nada e que o tamanho colossal de sua empresa permitiria mudar o mercado onde ela atua! Isso quer dizer, no bom português, que estaremos diante, no futuro próximo, de um gigante "dedo-duro"!
A Odebecht só se manterá no mercado público se denunciar, representar e acusar todos os agentes que se corrompem e lhes tiram oportunidades, só assim, em paridade de armas, poderá sobreviver! O Ministério Público ganhou o maior dos pit-bull!
O efeito cascata da atuação, nesse nível, de um colosso como a Odebecht vai, certamente, por o trem da corrupção nos trilhos!
E basta ver as suas desculpas para entender o recado direto, literal:
"Não seremos complacentes. Este Compromisso é uma demonstração da nossa determinação de mudança: 1. Combater e não tolerar a corrupção em quaisquer de suas formas, inclusive extorsão e suborno. .... 8. Contribuir individual e coletivamente para mudanças necessárias nos mercados e nos ambientes onde possa haver indução a desvios de conduta."
Sim, sou otimista, mas não vejo outro caminho, desnudados, os operadores de recursos públicos ou se reinventam ou "rezam para parecerem honestos"!

Gilberto Vieira é advogado.